domingo, 18 de março de 2012

Alcoviteira


A revista Nuance, da Editora Brasil Tropical, publicou em sua mais recente edição este conto de minha autoria, intitulado "Alcoviteira", que é, na verdade, um esboço do livro que estou escrevendo para ser lançado após o sucesso do "Onde estava o arco-íris?". Quem quiser conferir, aí está o texto na íntegra: 
Edna tinha apenas cinco anos de idade quando foi passar as primeiras férias escolares no sítio dos tios Albanisa e Jonas, localizado em Guaiúba. Filha única do casal Joaquim e Natércia, que morava no Mucuripe, ela achou bacana aquela oportunidade de vivenciar alguns dias respirando ar puro e participando de brincadeiras diferentes com os primos Carlinhos, Betinho, Augustinho e Carminha. A menina ficou tão encantada com as coisas do campo que resolveu, a partir dali, curtir todas as férias no interior. Mal terminavam os períodos letivos, ela se mandava para desfrutar dos prazeres juvenis que não encontrava na capital. 
Quando estava com nove anos, começou a sentir uma atração especial por Carminha, que, por sinal, era da sua mesma faixa etária. A prima achou a situação meio esquisita, notadamente depois do dia em que, encontrando-se sozinhas, na beira de um riacho, as duas trocaram um rápido “selinho”. Assim, aos poucos, em meio a carícias inocentes, e outras ousadas, descobriram que estavam apaixonadas e decidiram alimentar um namoro às escondidas de todos.
Os encontros fortuitos, que já duravam vários anos, sofreram um abalo sísmico quando Jonas, genitor de Carminha, revelou a intenção de casá-la com Maneco, um jovem residente em Pacatuba. O homem possuía uma mentalidade das antigas – achava que os pais deviam arranjar casamentos para as filhas, sem importar se elas gostavam ou não dos futuros maridos.
A menina, então com 15 anos, na ânsia de demover o pai da idéia, anunciou para a família o seu romance com Edna. A reação entre os parentes foi tão negativa que, a partir daquela data, as jovens ficaram proibidas de se encontrarem. Jonas, tentando abafar o que considerava um possível “escândalo” de maiores proporções, apressou o casório da filha com Maneco e os dois foram morar no Benfica, em Fortaleza. Edna, por sua vez, desolada, começou a trabalhar numa loja de confecções no Centro, entregando-se a uma solidão inquebrantável.
Quatro anos depois, caminhando pela Praça do Ferreira, ela deu de cara com Carminha, acompanhada de uma criança e carregando várias sacolas. Elas ficaram frente a frente, mudas, constrangidas, sem saber o que fazer. Edna tomou a iniciativa de travar um diálogo, rápido e confuso, que terminou com uma pedindo o número do celular da outra, para conversarem posteriormente. Assim, o romance recomeçou, agora com mais intensidade.
Mas o marido de Carminha descobriu a traição. Ao saber que as primas estavam se encontrando num apartamento, ele pegou um revólver, chegou lá, arrombou a porta e flagrou as duas na cama, entregues aos prazeres da carne. Cego de ódio, efetuou seis disparos à queima-roupa: três em Edna, três em Carminha.
A polícia apareceu meia hora depois e achou os corpos das moças inertes, com as mãos entrelaçadas, como se quisessem mostrar ao mundo que nasceram para viver uma ao lado da outra, mas, como a intolerância da sociedade não permitiu que isso acontecesse em vida, o destino estava selando aquela união tendo a morte como alcoviteira.

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